
As discussões sobre minerais críticos ou estratégicos têm sido um tema frequentemente relacionado à transição energética. Essa transição tem como meta a substituição da energia fóssil (petróleo, gasolina, diesel, querosene), seja na mobilidade urbana, seja no uso industrial, por uma energia que não emite gases do efeito estufa, como a elétrica, solar ou eólica.
As baterias de carros elétricos, ou de painéis solares são fundamentais para gerar corrente elétrica, sendo compostas por diferentes tipos de minerais, como lítio, cádmio ou níquel. Além desses minerais outros como cobre, alumínio, cobalto integram os circuitos eletrônicos de computadores em centros de processamento de dados espalhados pelo mundo, responsáveis por armazenar imagens, textos, vídeos, todo tipo de informação digital.
A demanda por esses minerais tem feito com que grandes projetos de mineração tenham se voltado para a pesquisa de novos locais de exploração. No Brasil um projeto de extração de lítio tem modificado a paisagem no Vale do Jequitinhonha; na região de Carajás o projeto Salobo será expandido para ampliar a extração de cobre. Projetos, como qualquer outro de significativo impacto ambiental, necessitam passar por um processo de licenciamento ambiental.
O governo brasileiro criou em 2021 a Política de Apoio ao Licenciamento Ambiental de Projetos de Investimentos para a Produção de Minerais Estratégicos. Essa política teria “a finalidade de articular ações entre órgãos públicos no sentido de priorizar os esforços governamentais para a implantação de projetos de produção de minerais estratégicos para o desenvolvimento do País”. A óbvia face desta política é o neoextrativismo1, mas vai além. O Brasil ampliou consideravelmente o leque de minerais estratégicos, incluindo 28 minerais2 metálicos não metálicos que podem ser explorados.
Segundo a Política, o país tem três tipos de minerais estratégicos: 1) aqueles que são importados; 2) aqueles para processos de alta tecnologia e 3) aqueles são essenciais para a geração de superávit da balança comercial3. Assim, no Brasil são estratégicos: fosfato, potássio, cobre, lítio, nióbio, cobre, ferro, alumínio e até ouro. Ainda, um Comitê Interministerial de Análise de Projetos de Minerais Estratégicos define a cada reunião quais são os projetos de exploração estão alinhados a essa política.
É sabido que grandes projetos de mineração causam conflitos socioambientais e que esses conflitos têm aumentado à medida que novas áreas de exploração são abertas. Com a ampliação do conceito de minerais estratégicos, vários projetos que não estão ligados à transição energética têm prioridade nas tratativas de licenciamento, como ferro explorado pela Vale em Carajás, a extração de ouro pela Belo Sun na Xingu e a ampliação das minas de bauxita pela MRN em Oriximiná.
O Comitê Interministerial que define os projetos estratégicos não traz entre os participantes o Ministério do Meio Ambiente, mesmo se tratando de prioridades para o licenciamento ambiental. Sendo uma articulação para ampliar o esforço de implementação desses projetos, fica evidente que essa articulação não leva em consideração questões ambientais, sendo mais uma política pública voltada para o aumento da produção mineral.
Com a recente aprovação da Lei Geral de Licenciamentos no Senado Federal4 tais projetos prioritários poderão ter respaldo na legislação ambiental. A inclusão de uma nova categoria de licença ambiental, a Licença Ambiental Especial, cria um “procedimento especial para atividades ou empreendimentos estratégicos, assim definidos em decreto mediante proposta bianual do Conselho de Governo”. Dessa forma o órgão licenciador estará obrigado por lei a dar prioridade à análise de empreendimentos que o governo considere relevante e, aprová-los de forma rápida, pois o Licenciamento Especial só admite uma fase, a de operação; abolindo-se as licenças prévia e de instalação.
Casam-se assim os interesses das mineradoras e do Estado para alavancar a produção mineral do país. O licenciamento ambiental visto como empecilho ao desenvolvimento foi destravado para supostamente promover uma economia verde e descarbonizada. Por ora, o que temos no país é uma economia mineral neoextrativista, em boa medida baseada na Amazônia, que tem fornecido os minerais para o desenvolvimento econômico e a transição energética longe, bem longe de suas fronteiras.
Igor Basílio-Silva é geólogo, mestrando em Desenvolvimento do Trópico Úmido (UFPA)
- Neoextrativismo: modelo de desenvolvimento baseado na extração de recursos naturais com políticas sociais redistributivas. Apesar da intervenção do Estado os conflitos socioambientais continuam presentes. ↩︎
- Cf. a resolução nº 2 do Comitê Interministerial de Análise de Projetos de Minerais Estratégicos que definiu quais são os minerais estratégicos. ↩︎
- Superávit: quando um país exporta mais produtos do que importa. ↩︎
- O projeto de lie ainda pendente de reavaliação na Câmara dos Deputados e de aprovação pela Presidência da República. ↩︎

Parabéns pelo texto esclarecedor sobre transição energética. No discurso tratada como solução, mas contraditoriamente carrega inúmeros problemas com sérios danos ambientais, como bem mostrado.